Medida ajuda o BC a continuar cortando os juros, mas complica a aplicação mais popular do país.
O governo federal pretende cobrar Imposto de Renda dos rendimentos da caderneta de poupança a partir de janeiro de 2010. A tributação, que tem como objetivo impedir que grandes investidores migrem para esse tipo de aplicação, incidirá somente sobre depósitos acima de R$ 50 mil. Até que a nova regra entre em vigor, o governo reduzirá o IR dos fundos de investimento - que hoje varia de 15% a 22,5% e deve passar a ter uma alíquota única de 15%.
Segundo o Ministério da Fazenda, menos de 1% dos poupadores do país têm saldo acima de R$ 50 mil na caderneta de poupança. A incidência do IR sera somente sobre o valor que ultrapassar esse limite - assim, uma aplicação de R$ 70 mil pagará imposto sobre R$ 20 mil. Hoje, os rendimentos da poupança estão isentos e a alteração precisa ser aprovada pelo Congresso. Os dados referentes a dezembro de 2008 revelam que 894,8 mil contas têm saldo superior a R$ 50 mil. Apesar do pequeno número, esse conjunto de poupadores tem 40,8% de todos os depósitos das cadernetas, o equivalente a R$ 110,5 bilhões.
O sistema de tributação da poupança apresentado ontem é complexo porque está ligado à variação da taxa básica de juros, a Selic. O imposto começaria a ser cobrado sempre que a Selic cair abaixo de 10,5% ao ano - hoje ela está em 10,25% ao ano. O tributo aumentaria até chegar à aliquota máxima de 27,5%, no caso de a Selic ficar abaixo de 7,25% ao ano. O pagamento do imposto será feito, para a grande maioria dos poupadores, na declaração anual do IR. Somente cadernetas com rendimento tributável mensal acima do limite de isenção, projetado para ficarem R$ 1.499,15 no ano que vem, pagariam o tributo na fonte.
De acordo com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, as mudanças têm como objetivo evitar uma migração de recursos dos fundos para a poupança - a caderneta, que tem juros fixados em lei de 0,5% ao mês, tende a ficar mais rentável do que boa parte dos fundos, cujos rendimentos estão ligados à Selic. Para o governo, isso poderia causar problemas na rolagem de sua dívida.
Críticas
A mudança na tributação da poupança é criticada por economistas que apontam para opções que não alterariam esse investimento. "O governo quer mudar um modelo que funciona bem em função de uma situação momentânea. É verdade que a migração dos fundos será evitada, mas a um custo para quem confia na poupança como forma de guardar dinheiro", afirma Nelson Luiz Paula de Oliveira, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-PR). Na opinião de Oliveira, a Fazenda poderia simplesmente manter a desoneração dos fundos de investimento após janeiro de 2010.
O economista Manuel Enriquez Garcia, professor da FEA/USP e vice-presidente do Conselho Estadual de Economia de São Paulo (Corecon-SP), destaca que a complexidade do modelo de tributação divulgado ontem não se encaixa no perfil da caderneta. "A metodologia é confusa, cheia de redutores e gatilhos. As pessoas investem na poupança porque ela é simples. Mesmo quem conhece bem tributos vai ter dificuldade", afirma. Além disso, Garcia critica o limite de R$ 50 mil escolhido pela Fazenda. "Há muitas contas acima disso, de aposentados que pouparam a vida toda, ou de depósitos judiciais que esperam a liberação, como em casos de inventários", completa.
Na opinião de Garcia, o governo deveria ter anunciado apenas a redução da tributação sobre os fundos, que ocorreria de qualquer forma, esperando o fim do ano para ver se seria mesmo necessário mexer na caderneta. "E também poderia pressionar os bancos para baixar as taxas de administração. É claro que eles têm um custo, mas taxas de 4% sobre o patrimônio são herança de um período inflacionário".
Para Jackson Sandrini, professor da área de finanças da UFPR, o governo corre o risco de, além de ver uma reação popular contrária às mudanças, ter de em pouco tempo anunciar novas medidas. "As taxas de administração dos fundos continuam altas. Não fiquei convencido de que a tributação será suficiente para resolver o problema", afirma. A sugestão de Sandrini é que a poupança volte a ser uma aplicação como correção trimestral, em vez de mensal.
ALTERAÇÕES
Depois de muita discussão, o governo definiu as alterações nas regras da poupança. Parte dos rendimentos sofrerá desconto do Imposto de Renda.
> O rendimento sobre o saldo de até R$ 50 mil continua isento de IR.
> O rendimento sobre o saldo que ultrapassar R$ 50 mil será tributado.
A parcela que será tributada vai depender da taxa de juros Selic vigente naquele mês.
Quanto menor a taxa, maior a parcela do rendimento que sofrerá desconto do IR;
Taxa Selic Parcela do rendimento que será tributada
- até 7,25 %..............= 100 %
- até 7,75 %..............= 80 %
- até 8,25 %..............= 60 %
- até 8,75 %..............= 40 %
- até 10,00 %............= 30 %
- até 10,50 %............= 20 %
- acima de 10,50 %.....= 0 %
O desconto do IR pode ocorre na fonte ou na declaração anual.
> NA FONTE: em 2010, só aplicações com rendimento superior a R$ 1.499,15 por mês terão o Imposto de Renda descontado diretamente na fonte. Por exemplo, com juros em 9% ao ano, só um aplicador que tiver mais de R$ 1,049 milhão depositado sofrerá retenção nafonte.
> NA DECLARAÇÃO: quando o rendimento for inferior a R$ 1.499,15, o desconto ocorrerá somente na declaração de IR que o contribuinte fará no ano seguinte. Para tanto, ele terá de informar, na declaração, o rendimento bruto da caderneta de todos os meses do ano a que se refere a declaração.
Se o contribuinte tiver mais de uma conta de poupança, ou se seus dependentes também tiverem conta de poupança, será preciso somar o valor total dos rendimentos dessas contas, para cada mês.
Com base nas informações, o sistema da receita vai calcular o imposto devido.
fonte: Jornal "Gazeta do Povo", Curitiba - 14/05/09
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